Este texto foi apresentado na 1ª jornada de Educação a Distância, como material de apoio ao minicurso com o mesmo título, no qual as discussões foram realizadas virtualmente.
Espero que curtam!
AS
PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NO 1º ANO DE ALFABETIZAÇÃO
Eliana Moreira Amaral de Souza
[1]
RESUMO
O presente artigo pretende apresentar algumas considerações
sobre a prática pedagógica trabalhada no 1º ano de alfabetização, com intuito
de desmistificar a crescente discussão acerca do “abandono” do brincar em
detrimento ao estudar na rotina da criança. Neste sentido abordaremos práticas
pedagógicas que podem contribuir para com o trabalho do professor/da professora
em busca da alfabetização de sua turma. Vygotski e Snyders nos dão aporte
teórico neste processo para pensar em que a teoria/prática/teoria devem permear
as práticas pedagógicas, promovendo a interação entre saber cotidiano e saber
elaborado, guiados pela mediação, oferecendo da sala de aula, subsídios
importantes para que a alfabetização aconteça de forma paulatina, tranquila,
prazerosa e adequada.
Palavras-chave: Educação. Práticas
pedagógicas. Sala de aula. 1º ano de alfabetização.
1 INTRODUÇÃO
Com ampliação do Ensino Fundamental de
oito para nove anos no Brasil, muitas dúvidas sobre como organizar o ensino
para as crianças começaram a ser discutidas. A prática de sala de aula, chama
os atores envolvidos a repensar a estrutura da escola, na qual o espaço físico,
material escolar, conteúdos e formação de professores, passam a ser pontos de
grande relevância no cenário educacional.
A inclusão da criança no ensino
obrigatório, em comprimento a lei nº 11.274/2006
[2],
coloca em discussão a rotina da criança que mudaria seu tempo e seu espaço
trocando o brincar pelo estudar. No qual a brincadeira ficaria em segundo
plano. Tais preocupações fomentaram discussões entre profissionais da educação
e colocam em xeque a prática pedagógica a ser utilizada na sala de aula com
crianças no 1º ano de alfabetização.
2 O que dizem os autores?
Para Kramer (2006):
a educação infantil e o ensino fundamental são
indissociáveis, pois ambos envolvem conhecimentos e afetos; saberes
e valores; cuidados e atenção; seriedade e riso. O cuidado, a atenção, o
acolhimento estão presentes na educação infantil; a alegria e a brincadeira
também, nas práticas realizadas, as crianças aprendem e elas gostam de
aprender. Na educação infantil e no ensino fundamental, o objetivo é atuar com
liberdade para assegurar a apropriação e a construção do conhecimento por
todos.
Ainda sobre esse processo de transição,
MAREGA & SFORNI (2011, p.144) destacam:
(...) no período em que as crianças ingressam no 1º ano do
Ensino Fundamental está ocorrendo um movimento de transição da atividade lúdica
para a atividade de estudo. Nesse momento, ocorre uma contradição entre o modo
de vida que a criança tem, marcado pela dependência do adulto, e aquele que ela
pode vir a ter, ao se tornar mais autônoma para algumas atividades. (...). As
mudanças externas provocam as mudanças internas do sujeito, fazendo com que ele
passe de um estágio a outro.
Deste modo, a inclusão de
crianças de seis anos no ensino fundamental convida ao diálogo entre educação
infantil e ensino fundamental, diálogo não só institucional, mas também
pedagógico, no qual a proposta curricular deve contemplar claramente tais
situações.
3 Práticas
Pedagógicas: relato de experiência
Ao falarmos das práticas pedagógicas na sala de aula com crianças no seu
1º ano de alfabetização, queremos lembrar que nossos relatos são frutos de
vivência de mais de 15 anos de trabalho na rede pública e privada. Trabalho
este que hoje ao se tornar este artigo, revela que essas ações foram e são
construídas e revistas ao longo desta trajetória e, fizeram a
diferença não só na vida das crianças como na da professora.
Tais práticas advêm do movimento teoria/prática/teoria. Movimento
embasado teoricamente por autores como Snyders e Vygotski, que ao longo deste
processo nos convida a rever a prática pedagógica de uma forma dialética.
Para Snyders (1988) a criança chega à escola com sua cultura primeira e a
escola com seu conhecimento elaborado cientificamente deve mediar o acesso da
criança a esse saber. Neste mesmo sentido e, valorizando esta interação de saberes,
Vygotski (1989) aponta que é na interação com outros sujeitos que formas de
pensar são construídas.
É fundamental, portanto, que as práticas pedagógicas desenvolvidas na
sala de aula contemplem a interação no processo de alfabetização, já que é na escola acontece à educação
sistemática, onde ocorre a mediação entre o indivíduo e o saber elaborado. E, é
nessa mediação que deve residir à ação docente por meio de um ensino
intencional, planejado e organizado.
Mesmo a criança
entrando para a escola com seis ou menos anos de idade, a prática pedagógica no
ensino fundamental exige sistematização intencional dos conteúdos propostos. O
trabalho com os conteúdos escolares deve instrumentalizar o aluno/a aluna para
sua inserção na cultura letrada, deve dar condições para que as operações
mentais expressem a apropriação de conceitos mais elaborados e complexos, em
todas as disciplinas.
Para tanto a
efetivação da prática em sala de aula deve expressar o grau de consciência
político e pedagógico de cada Professor/Professora. A preocupação com o
desenvolvimento de um processo de ensino para todos os alunos/alunas envolve
transmissão, mediação de conhecimentos que ampliem a compreensão da realidade,
que apontem formas concretas de participação social.
Tomando esse referencial expresso na proposta curricular
[3],
ao pegar o livro de chamada de uma turma de 1° ano de alfabetização, a primeira
atitude que o professor deve tomar é conhecer seus alunos por nome, sobrenome e
principalmente a data de nascimento das crianças que o acompanhará durante
aquele ano letivo. Isto porque cada criança tem seu nível de desenvolvimento
cognitivo e este deve ser respeitado.
A avaliação diagnóstica da turma é um bom parâmetro para o trabalho do
professor que identificaram quais são os conhecimentos a priori da criança e a
partir dele traçará seu plano de trabalho, para atender assim a diversidade da
sala. A avaliação possibilita ao professor estudar e interpretar os dados da
aprendizagem e de seu próprio trabalho, com a finalidade de acompanhar e
aperfeiçoar o processo de ensino, assim como, tomar novas decisões e
encaminhamentos pedagógicos objetivando a alfabetização.
É importante que o professor faça constante avaliações diagnósticas na
turma para assim perceber os avanços e/ou recuos que sua turma por ventura
venha a ter. Uma pasta com o nome da criança para ir arquivando estas
avaliações contribui muito para com a conversa com a supervisão e a orientação
no conselho de classe.
A avaliação diagnóstica para a turma do 1º ano pode partir do desenho da
criança. Pedindo que ela desenhe uma figura humana. Cabe aqui destacar que
desde 2008 com a lei 11.700
[4] as
crianças que tem acesso as atividades desenvolvidas nos Centros de Educação
Infantil podem ter um desenvolvimento global tranquilo do próprio corpo. Caso
contrário, atividades que explorem o esquema corporal como: coordenação motora
Grossa (andar, correr, pular, andar sobre linhas curvas e retas, sobre o meio
fio, etc.. E, coordenação motora fina, movimento de pinça com atividades de
modelar, rasgar, amassar, dobrar, empilhar, montar, etc., devem ser exploradas
por meio de atividades lúdicas planejadas e intencionais. A disciplina de
Educação Física pode colabora e muito para com o desenvolvimento dessas áreas.
Sobre
essa questão, Oliveira (1997 p. 35), pontua:
a educação
psicomotora deve ser considerada uma
educação de base na educação infantil. Ela condiciona os aprendizados
escolares; leva a criança a tomar consciência de seu corpo, da lateralidade, a
situação no espaço, a dominar seu tempo, a adquirir habilidades de seus gestos
e movimentos.
Isto posto cabe levantar uma discussão acerca do número de crianças em
sala e a grande diversidade de desenvolvimento que a sala de aula contempla. E,
é frente a essa diversidade que a diagnóstica deve acontecer para assim
direcionar o trabalho a ser desenvolvido pelo professor/professora. Com vistas
para a alfabetização o planejamento das aulas deve primar pela rotina e por um
ambiente alfabetizador e matematizador que mediados pelo trabalho do professor/professora
atinja tais objetivos.
Cabe, portanto ao professor diferenciar a rotina diária e permanente:
u
ROTINA PERMANENTE – Todos os dias
o professor precisa trabalhar ORALIDADE / LEITURA / ESCRITA.
u
ROTINA DIÁRIA - Atividades
envolvendo leitura do alfabeto, calendário, jogos, lista de chamada,
musicalização.
O professor precisa planejar e organizar uma rotina para que aconteça a
alfabetização. A rotina não deve ser vista como sendo rígida e estática. Ela
deverá sim, ter uma espinha dorsal, mas com mobilidade, quando necessário.
Neste sentido a rotina é o que
se faz todos os dias de forma sistematizada e precisa ter uma intencionalidade.
Para que a intencionalidade presente no trabalho organizado do professor
na rotina escolar deve promover a interação e o entrosamento de todos os
membros do grupo, gerando socialização, extroversão, espontaneidade; oportuniza
a construção do conhecimento relativo aos diferentes conteúdos (conceituais,
procedimentais, e atitudinais) é necessário que a sala de aula seja um ambiente
que transpire alfabetização.
Um ambiente alfabetizador e matematizador é importantíssimo neste
momento, pois estes ambientes devem conter materiais concretos como tampinhas,
palitos, retalhos de madeira, textos (textoteca), desafios matemáticos (matematoteca),
alfacabo, alfabeto móvel. Toda ambientação da sala deve ser construída pela e
para a criança e colocada sempre ao alcance da criança.
Neste sentido os referidos ambientes proporcionam o desenvolvimento do
raciocínio, da memória, da imaginação, da capacidade de concentrar, atenção;
valoriza a presença e a participação de cada criança nas atividades, permitindo
rodízio equitativo entre todos, sem vantagens ou desvantagens, delegando
funções e dividindo responsabilidades, visando assim atingir a necessidade
psicossocial da criança como cidadã e como sujeito de sua própria aprendizagem.
Para isso, podem ser
organizados cantinhos na sala de aula, compostos de elementos que ofereçam
oportunidades de desenvolver as individualidades, recheados de experiências
significativas para seu desenvolvimento.
Os espaços são indicadores
de possibilidades de organização da sala de aula, sendo que cada profissional
da educação deve ter consciência das características de seu grupo de alunos,
organizando aqueles que realmente possam contribuir para o desenvolvimento de
brincadeiras e situações que venham enriquecer o cotidiano da sala de aula.
Assim ao propiciar a exploração das atividades iniciais (rotina diária),
de forma interdisciplinar, aproveitando diferentes situações para desenvolver
diferentes conteúdos ou ampliar conceitos e vivências, possibilita atender às
necessidades de variação, criação e alternância, a partir das atividades
constantes como rotineiras.
Isto posto cabe destacar três pontos importantes para
que a alfabetização aconteça de fato: Oralidade, Leitura e escrita. Tais
elementos devem permear todo processo de alfabetização. Da seguinte forma:
Oralidade: do aluno e do professor.
Leitura: do aluno e do professor.
Escrita: do aluno e do professor.
Observando esse movimento,
podemos constatar que não só a ALFABETIZAÇÃO acontece como também o LETRAMENTO.
Sobre esses processos podemos perceber que Bertoletti
(2005, p 41) destaca:
(...) na história da
alfabetização brasileira, a aquisição da leitura e da escrita vem sendo
considerada de duas formas: uma relativa à aquisição de uma técnica
(alfabetização), que consiste em decodificar e codificar a língua escrita; e
outra, relativa ao resultado da ação de ensino e de aprendizagem das práticas
sociais de leitura e escrita (letramento). Na alfabetização, o indivíduo tem
acesso à técnica da língua escrita que não muda seu estado ou condição; no
letramento, o indivíduo usa, pratica a língua escrita, interage com diferentes
portadores e gêneros de texto, o que muda seu estado ou condição cultural,
social, política, linguística, psíquica (SOARES, 2003a), ou seja, o que torna o
indivíduo, sujeito.
Assim percebemos que a
alfabetização é uma ação de ensinar/aprender a ler e a escrever. Na
leitura capacidade de decodificar os sinais gráficos transformando-os em sons.
E na escrita, a capacidade de codificar os sons da fala, transformando-os em
sinais gráficos. Enquanto que o letramento
é o estado ou condição de quem não apenas sabe ler e escrever, mas cultiva e
exerce as práticas sociais que usam a escrita.
Frente aos pressupostos teóricos e práticos elencados até agora, o
professor/professora é de suma importância para que o trabalho desenvolvido
realmente aconteça. A equipe gestora da escola precisa acompanhar o trabalho,
bem como perceber se o professor/professora tem perfil para atuar na turma.
Cabe destacar que para atuar com uma turma em fase de alfabetização, o
professor/professora deve ser afetivo, gostar do que faz e manter-se sempre
atualizado profissionalmente. Para tanto a formação continuada e a formação em
serviço, devem ser norteadoras desse alfabetizador.
Segundo Mazzeu (1998, p. 59):
a
formação continuada do professor, centra-se na finalidade primeira de levar aos
alunos a dominarem os conhecimentos acumulados historicamente pela humanidade.
Para conseguir que os alunos se apropriem do saber escolar de modo a se
tornarem autônomos e críticos, o professor precisa estar ele próprio,
apropriando-se desse saber e tornando-se cada vez mais autônomo e crítico. Portanto,
a formação continuada deve ser analisada com base no conceito de humanização.
Conceito este que possibilita uma compreensão mais ampla e profunda e que deve
ser compreendida como aquisição de uma postura prático-reflexiva ou
crítico-reflexivo, na qual seja dado o devido peso ao processo de apropriação,
pelo professor, do saber acumulado historicamente.
Já acerca da formação em serviço Shudo (2011) que
esse é um papel que cabe à equipe pedagógica da escola o trabalho junto à sala
de aula, possibilitando à professora/professor na solução de dificuldades de
ensino/aprendizagem que porventura possam surgir no decorrer do processo.
Tomando esse percurso acerca da formação do
professor Shudo (2011) que além deste item, a leitura e o investimento na
educação infantil, são de suma importância para que a qualidade da Educação
aconteça com êxito. Para tanto o papel da família deve estar inserida também no
processo de alfabetização. Para exemplificar a importância da família neste
processo buscamos na pesquisa do instituto pró-livro dados que mostra a
influência da família no processo de acesso da criança a leitura.
4 CONCLUSÃO
A alfabetização no 1º ano do
Ensino Fundamental pode acontecer de forma gradativa e agradável se todos os
envolvidos estiverem preparados para realizar tal tarefa com organização,
intencionalidade e planejamento, sem o abandono do brincar e, sim contar com a
realização de atividades lúdicas que atinjam os objetivos traçados. Inserí-la num universo que a estimule e a
desafie a todo o momento, mediando e propiciando situações na qual a
intencionalidade e o planejamento organizados, somados a um ambiente composto
por atividades lúdicas e rotineiras.
Neste sentido a sala de
aula deve refletir e possuir todos os recursos necessários para a rotina do
trabalho pedagógico. Sendo assim, precisamos pensar em espaços que possibilitem
vivências agradáveis e seguras para as crianças e que proporcionem desafios ao
seu desenvolvimento.
Nesta perspectiva, o educador/educadora no processo ensino/aprendizagem atua
como mediador e deve buscar na equipe pedagógica da escola apoio para sua
formação constante e assim desenvolver práticas pedagógicas que privilegiem o
movimento teoria/prática/teoria. Movimento este que valorizem e estimule a
alfabetização da criança.
REFERÊNCIAS
Bertoletti. Estela N. M. Alfabetização
e letramento. In: Anais do II Sciencult – Simpósio Científico culturas:
caminhos da diversidade: desafios e perspectivas. 2005. p 42.
KRAMER,
S. As crianças de 0 a 6 anos nas políticas educacionais no Brasil: educação
infantil e/é fundamental. Educação e Sociedade, Campinas,
SP, v. 27, n. 96, out. 2006.
MARINGÁ.
Proposta curricular da Educação Infantil e do Ensino Fundamental da
Secretaria Municipal da Educação. 2008.
MAZZEU, Francisco José Carvalho. Uma proposta metodológica para a formação
continuada de professores na perspectiva histórico-social. Cad.
CEDES [online]. 1998, vol.19, n.44, pp. 59-72. ISSN 0101-3262.
http://dx.doi.org/10.1590/S0101-32621998000100006.
MAREGA,
Agatha M. P. & SFORNI, Marta S. F. A
criança de seis anos na escola: É hora de brincar ou de estudar? In:
Revista Contrapontos – Eletrônica. Vol. 11 - n. 2 - p. 144 / mai-ago 2011.
NOVA ESCOLA. Alfabetização.
Edição Especial. Distribuidora Nacional de Publicações (Dinap S.A). São Paulo.
OLIVEIRA,
Gislene de Campos. Psicomotricidade:
Educação e Reeducação num enfoque psicopedagógico. Petrópolis, RJ: Vozes,
1997, p. 35.
SNYDERS,
Georges. A alegria na escola. s/l: Manole, 1988.
SOARES, Magda. Letramento
– um tema em três gêneros. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2003a.
VIGOTSKI, L. S. A construção do pensamento e da linguagem.
São Paulo: Martins
Fontes, 2001.
VYGOTSKI, L. S. Formação social da mente. 3. ed., São
Paulo: Martins Fontes,
1989.
[2] Altera a
redação dos arts. 29, 30, 32 e 87 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que
estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, dispondo sobre a duração
de 9 (nove) anos para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir
dos 6 (seis) anos de idade.
[3] Proposta curricular da Educação
Infantil e do Ensino Fundamental da Secretaria Municipal da Educação. 2008
[4] Acrescenta inciso X ao caput do art.
4o
da Lei no
9.394,
de 20 de dezembro de 1996, para assegurar vaga na escola pública de educação
infantil ou de ensino fundamental mais próxima de sua residência a toda criança
a partir dos 4 (quatro) anos de idade.